quarta-feira, 31 de julho de 2013

O futuro do país que começou a nascer em junho


Observadores com diferentes formações profissionais e políticos de vários partidos dão a sua visão sobre os protestos e os efeitos que eles podem ter no futuro do país

Júlia Aguiar
Manifestação realizada em São Paulo no último dia 17 de junho



Publicamos hoje mais um texto sobre o significado das manifestações de rua realizadas no país desde junho e quais podem ser os seus desdobramentos. Desta vez, a contribuição vem do cientista político Hamilton Garcia de Lima. Ao longo das últimas semanas, levamos ao ar dezenas de artigos e entrevistas com o mesmo propósito: refletir sobre essa nova nação que brotou, quando se menos esperava, do asfalto de várias cidades brasileiras a partir daqueles históricos dias de junho. Como é próprio deste site, a diversidade e o desejo de ampliar o debate deram o tom dessas análises.
Você que está na área há mais tempo sabe que aqui tem lugar pro cardeal e pro coroinha, mas sem barrar a entrada dos evangélicos ou dos ateus. Dizer que não fazemos proselitismo seria mentira. Queremos muito contribuir para melhorar, por mais modestamente que seja, a qualidade da democracia brasileira. Daí, por exemplo, a conclamação que fazemos anualmente à sociedade para que nos ajude a escolher os melhores parlamentares do país. Mas somos irrecuperavelmente apartidários e não estamos querendo empurrar credo ideológico nenhum pela goela de ninguém.
Assim, tiveram – e têm – voz em nossas páginas desde pesquisadores de renome ou políticos de expressão nacional até estudantes mais ou menos anônimos. Pensadores religiosos, filósofos, trabalhadores, empresários, acadêmicos distantes de agremiações partidárias ou militantes de diferentes partidos (muitos dos quais, colaboradores regulares do Congresso em Foco). Entendemos que colocar essa pluralidade de visões e perspectivas à sua disposição é o melhor a fazer para que você tire suas conclusões por conta própria. E, se por acaso você achar que tem algo a acrescentar, manda bala e envia a sua contribuição – em texto, vídeo, foto, charge, o que for – para redação@congressoemfoco.com.br. Será um prazer examinar suas sugestões.
Em ordem alfabética, apresentamos abaixo algumas das pessoas que, como tantos de nós, se empenham no momento em compreender as ruas de 2013 para sondar os caminhos que podem levar ao Brasil de amanhã.
Basta clicar no nome de cada uma delas para ler a íntegra do artigo ou entrevista. Para outros textos sobre o assunto, clique aqui.
Alcides Leite, economista e professor da Trevisan Escola de Negócios
Certo de que as manifestações são produto de uma “crise de gestão pública e não uma crise institucional”, afirma que “o povo está reclamando da relação custo/benefício dos serviços públicos” porque a “impressão geral é que os governos governam para si e não para a população”. Apresenta as bases de um pacto que Dilma deveria propor não à sociedade, mas ao seu próprio governo.
Alfredo Sirkis, deputado federal do PV (RJ), participa da organização da Rede, novo partido da ex-senadora Marina Silva

Analisa o sentimento antipartidário dos manifestantes e, mesmo admitindo que os atuais partidos brasileiros possuem uma “minúscula minoria de pessoas honradas”, afirma que “ainda não se inventou a democracia sem partidos”.
Allan Cotrim e Renato Lima, alunos de mestrado em Brasília
Dizem que as ruas representam “uma reação ao sistema político que se estagnou, envelheceu e se fechou ao diálogo com a população”. Criticam a aversão demonstrada pela maioria dos manifestantes a partidos políticos: “Se as decisões não são tomadas democraticamente, a saída é buscar outro partido (ou até fundar um). Se os partidos não são confiáveis, deve-se mudá-los, renovando-os por dentro, com novo frescor e novos filiados. Esta, sim, seria uma forma popular de se fazer reforma política. Certamente dá mais trabalho e leva tempo, mas quem disse que seria fácil?”.
Antônio Carlos de Medeiros, cientista politico
Para ele, as ruas consumaram a ruptura entre “uma sociedade e economia que se modernizam versus um sistema político arcaico e tradicional, portador do vírus da ingovernabilidade”. O analista também associa o Brasil que foi às ruas e os novos personagens que ele pôs em cena às possibilidades de ação política oferecidas pela internet e pelas novas tecnologias. E acrescenta que atender ao “quero mais” dos manifestantes obrigará os governantes sensíveis ao espírito de época a reverem suas escolhas econômicas e seus cálculos fiscais.
Chico Alencar, deputado federal do Psol (RJ)
Num texto que está mais para a crônica do que para o artigo de análise ou de opinião, diz que “as ruas do Brasil policlassista e a comunicação através da internet não são controláveis” e permitiram “um resgate do coletivo nesses tempos de hiperindividualismo”. Fala que os protestos representam “irupção, não revolução”, mas isso é o bastante para inquietar as autoridades que lançaram mão de violência e as “entidades de trabalhadores e de estudantes, burocratizadas, sempre alheias ao que não tem aval do oficialismo”.
Eduardo Campos, governador de Pernambuco, presidente nacional do PSB e possível candidato a presidente da República em 2014
Endossa o clamor popular com a “degradação da vida pública” e a baixa qualidade dos serviços em áreas como saúde, educação e segurança. Considera restrito plebiscito proposto por Dilma. E apresenta sua visão da crise e as tarefas que ela impõe. Entre elas, destaca a necessidade de ampliar os instrumentos de democracia direta, como maiores facilidades para apresentação de projetos de lei de iniciativa popular e a adoção do recall, que permitiria aos eleitores revogar os mandatos de políticos.
Érika Kokay, deputada federal do PT (DF)
Afirma, em artigo, que as “manifestações expressam, principalmente, um profundo descontentamento com a forma atual da democracia representative”, um momento de crise, mas é também uma oportunidade ímpar, uma oportunidade que não se manifestava há vinte anos, de oxigenarmos e revigorarmos a nossa democracia.
Leonardo Boff, pensador católico
Para Leonardo Boff, a despeito das críticas que possam e devam ser dirigidas “à nossa classe política corrupta” e ao governo Dilma e ao PT, “refém da macroeconomia neoliberal”, tais críticas precisam ser feitas “com critério e senso de medida” para não se levar “água ao moinho da direita”. Esta, conforme a sua análise, segue à espreita, com grande influência nos “meios de comunicação privados e familiares”, e também tentando se infiltrar nos protestos populares, urdindo “tramoias” que poderiam incluir “a volta do braço armado para limpar as ruas” e restabelecer o “velho status quo”.
Marcus Pestana, deputado federal do PSDB (MG)
Destacou o fato de nenhum instituto de pesquisa, cientista social, partido ou intelectual ter captado “o inimaginável potencial que havia no inconsciente coletivo”, que resultou numa “explosão de indignação e cidadania, difusa, surpreendente, instigante, desafiadora”, que não obedece a “um sentido único, reducionista, unilateral”. Conclui: “As ruas querem participar. Ser ouvidas. Isolar os marginais e vândalos. E longe da violência e da demagogia, construir o diálogo nacional necessário para continuar mudando o país”.
Timothy Power, professor da Universidade de Oxford, que estuda o Brasil desde 1990
Na sua opinião, os protestos são produto da insastifação com a má qualidade dos serviços públicos – a começar pelo transporte coletivo – e com todos os politicos e seus partidos, “aí não poupam ninguém”. Ele também remotas as possibilidades de forças políticas à direita se beneficiariem as manifestações, que, no seu entender, ainda não alteram o favoritismo da recandidatura Dilma.
Zé Maria, presidente nacional do PSTU
Acredita que os protestos rompem o quadro de “relativa estabilidade na luta de classes, numa relação de forças amplamente favorável às classes dominantes e controle político bastante forte do governo de frente popular encabeçado pelo PT”. Vê como pano de fundo das manifestações o “modelo econômico aplicado pelo governo Dilma”, que impede o atendimento às necessidades dos trabalhadores e “assegura o privilégio dos bancos, das grandes empresas, das empreiteiras e do agronegócio”. Ironiza “o fantasma do golpe de direita”, invocado por setores próximos ao PT, afirmando que quase toda a direita brasileira integra hoje a coalizão governista liderada por Dilma.

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