domingo, 31 de julho de 2016

Adolescente morto em Morro do Chapéu saiu de Salvador por medo da violência


 

Felipe, 16 anos, foi morar com o pai no município da Chapada Diamantina no início do ano

Natural de Salvador, o estudante Felipe Magalhães Gama, 16 anos, tinha ido morar na cidade de Morro do Chapéu, na Chapada Diamantina, desde o início deste ano, para fugir da violência em Salvador. A informação foi confirmada pela família de Felipe, durante o enterro do adolescente, na manhã deste sábado (30), no cemitério Bosque da Paz. 
Ele morreu na noite de quinta-feira (28), por volta das 19h, durante um assalto. Suspeitos de terem cometido o crime, dois adolescentes foram apreendidos pela polícia e um homem foi espancado até a morte por moradores do município. “Meu filho morava com a mãe até o início desse ano e, em janeiro, ele resolveu morar comigo por isso. A gente sempre tem essa visão de que o interior é mais tranquilo, mas essa não é a realidade da minha cidade hoje”, contou o pai de Felipe, Nilton Gama, ao CORREIO.  
Felipe voltava da escola quando foi morto numa tentativa de assalto 
(Foto: Reprodução/Facebook)
De acordo com a família, Felipe nunca tinha vivido uma situação de violência em Salvador, mas se sentia inseguro quanto à violência urbana em geral. Na capital, ele morava no condomínio Brisas, na Paralela, e estudava no Colégio Ponto Alto. Em Morro do Chapéu, Felipe estava cursando o 2º ano do Ensino Médio no Colégio Estadual Teotônio Marques Dourado Filho. “Ele era quieto, carinhoso, brincalhão. Era de beijar, abraçar. Não era de sair muito. Trabalhava no pet shop do pai dele e chegou a ganhar uma bolsa como melhor aluno da cidade”, disse a prima do estudante, Micaele Oliveira.
O corpo de Felipe foi enterrado sob muita comoção, com a presença de cerca de 100 pessoas. No cortejo, parentes e amigos carregaram também uma faixa com os dizeres: “Felipe, você estava no caminho certo. A educação e a sociedade estão de luto”. Durante o enterro, a mãe do estudante fez um desabafo aos presentes. 
“Se Deus permitiu que minha família carregasse esse fardo, então tinha que ser com Lipe. Meu filho é uma promessa. E meu outro filho pequeno veio e me disse 'Lipe está bem, Deus precisa dele lá no céu”, disse mãe dele, Érika Magalhães, na ocasião, aos presentes.  Felipe era filho único de Nilton, mas tinha um irmão de cinco anos, filho de sua mãe em outro casamento. Na sexta-feira (29), o corpo do estudante já havia sido velado em Morro do Chapéu, na Igreja Matriz.
Suspeito era conhecido por crimes na cidadeO crime aconteceu na noite de quinta-feira (28), por volta das 19h, quando Felipe voltava da escola. Ele foi abordado por José Milton Carlos Semeão, o Filó, 24, e dois adolescentes de 16 anos. O trio anunciou o assalto e, durante o crime, atiraram no rosto do estudante. O objetivo era roubar o celular do rapaz. 
“As pessoas que viram contam que ele disse que não ia dar e começou a andar para trás”, disse a prima dele, Micaele. Foi quando Felipe foi baleado. “Ele ainda caiu na frente da casa de um colega e pediu ajuda”. A vítima foi socorrida para um hospital, mas não resistiu aos ferimentos. Na cidade, chegou-se a fazer uma campanha para doação de sangue tipo O para Felipe, mas, segundo Micaele, o hospital local não tinha estrutura para fazer a transfusão. O estudante morreu antes que pudesse ser transferido para outra unidade de saúde, em Irecê. 
Segundo a assessoria da Polícia Civil, cerca de 30 minutos depois do crime, os três suspeitos foram presos por policiais militares. Eles foram levados para a delegacia da cidade e quando prestavam depoimento foram surpreendidos por uma multidão que invadiu a unidade. Os três foram arrastados para o lado de fora da delegacia e espancados. 
Ainda segundo a assessoria, foi José Milton quem atirou na vítima. Ele morreu depois de receber socos, pedradas e pauladas por todo o corpo. Os adolescentes também foram agredidos, mas, de acordo com a polícia, sem gravidade. Eles estão custodiados na 14ª Coordenadoria Regional de Polícia (Coorpin/ Irecê).
Embora a assessoria não tenha informado se José Milton tinha sido preso, nem o histórico dos adolescentes apreendidos, a prima de Felipe contou que José Milton era conhecido na cidade por outros crimes. No início do ano, inclusive, chegou a ser atingido por seis tiros, mas se recuperou. “Era uma pessoa que tinha trajetória no crime. Antes de encontrar Felipe, naquele dia, ele tentou roubar outras pessoas. Apesar disso, mãe dele é uma pessoa muito direita, da igreja, e tem outros filhos que não tem envolvimento com crime”. 
Apelo por segurançaSegundo ela, todos os moradores da cidade estão assustados. Na sexta-feira (29), a prefeitura de Morro do Chapéu cancelou a festa que comemoraria os 107 anos do município. “Estou assustada. Morro do Chapéu está abandonada, jogada às traças. Só Deus pelo povo. Ele (Felipe) foi um anjo que morreu para acordar a população de Morro do Chapéu”, desabafou Micaele. 
O pai de Felipe, Nilton Gama, também fez um apelo por segurança na cidade. “Meu apelo é que o poder público trabalhe com mais garra para aumentar o efetivo. Hoje só tem uma viatura, com dois PMs de plantão. Eles não dão conta. Espero que o poder público visualize isso, para não voltar a acontecer com outros pais de família. Sei que não fui o último (pai a perder um filho). Vai ter outros, mas que o poder público aja com mais garra. Está faltando algo. Está faltando educação, amor ao próximo e ações que coibam esse tipo de situação”. 
Na próxima sexta-feira (5), moradores da cidade organizam uma manifestação para pedir por mais segurança. O ato está previsto para acontecer na Praça da Música, ainda sem horário definido. 

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